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Varinia Bernales desenvolve substâncias químicas mais seguras e torna a ciência mais igualitária

A química computacional luta pelas mulheres na ciência

by Myriam Vidal Valero, exclusivo para a C&EN
September 20, 2024 | A version of this story appeared in Volume 102, Issue 29

 

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Varinia Bernales usa um jaleco azul e se inclina contra uma parede com uma janela. Dois pesquisadores estão refletidos na janela atrás de Bernales.
Credit: Sara Stathas
Varinia Bernales

Na infância, Varinia Bernales teve uma família que lhe incutiu o compromisso de dedicar sua carreira ao benefício da humanidade. Ela admirava especialmente sua tia Belgica, que trabalhava na Organização Mundial da Saúde fazendo pesquisas e desenvolvendo políticas sobre asbestose para melhorar a segurança dos trabalhadores. Bernales não pôde prever isso quando era criança no Chile, mas esse ideal familiar a guiou em uma carreira de sucesso na ciência e na promoção da defesa de direitos.

Informações vitais

Cidade natal: Santiago, Chile

Formação Acadêmica: Bacharelado em Química, 2009, e doutorado em Química, 2014, Universidade do Chile

Cargo atual: Cientista pesquisadora chefe no UL Research Institutes

Apelido: Avecilla (passarinho em espanhol). Foi dado a mim por um amigo querido que diz que estou sempre voando para cá e para lá.

Livro marcante: As veias abertas da América Latina de Eduardo Galeano. Guardo vários exemplares em casa, tanto em inglês quanto em espanhol, para dar de presente aos amigos. É a minha maneira de compartilhar minhas origens e um pouco do meu mundo com eles.

Eu sou: Uma mulher chilena, americana e latina

Atualmente, Bernales é uma das cientistas líderes de pesquisa do UL Research Institutes, nos arredores de Chicago, onde trabalha na simulação e criação de materiais destinados a tornar o mundo um lugar mais limpo e seguro.

Desde a graduação na Universidade do Chile, Bernales encantou-se com a química e estava sempre em busca de novas oportunidades de pesquisa. Foi voluntária em laboratórios que abrangiam toda a gama de ciências centrais: química supramolecular, síntese inorgânica, química do estado sólido e física quântica.

À medida que de aproximava da formatura de seu curso de bacharelado, ela leu um artigo que mudou radicalmente sua visão da química. O estudo explicava como os líquidos iônicos, um tipo de solvente que é mais fácil de conter e reciclar do que os solventes mais comuns, podiam ser modelados computacionalmente.

O artigo estava totalmente escrito em inglês, e Bernales demorou um pouco para lê-lo, visto que cresceu falando espanhol, mas, ao final, concluiu duas coisas: não apenas os líquidos iônicos poderiam reduzir o desperdício gerado pelas reações químicas, mas os modelos computacionais poderiam reduzir ainda mais o desperdício gerado pelo trabalho experimental.

Esses modelos lhe ofereceriam a flexibilidade “para explorar todas as possibilidades sem causar um impacto imediato no meio ambiente”, diz ela.

Mas quando começou a combinar a química verde com a química computacional, ela descobriu que pouquíssimos cientistas no Chile tinham familiaridade com os dois campos na época. “As pessoas achavam que estávamos apenas jogando videogame”, lembra Bernales.

Incentivada por seus professores, Bernales fez um estágio de duração de quatro meses na Universidade de Minnesota (UMN), Twin Cities durante seu doutorado em Química Computacional. Em vez de todos se fecharem em seus próprios projetos, alunos e professores reuniam-se com regularidade a fim de compartilhar seus resultados e gerar novas ideias como um grupo, e a academia fazia parcerias com o setor industrial com o intuito de avançar nas pesquisas.

Ela voltou à UMN para o pós-doutorado e decidiu sair da sua zona de conforto quanto aos líquidos iônicos. Ela colaborou com laboratórios envolvidos na resolução de novos problemas relativos à despoluição do planeta. Pesquisou questões tão diversas quanto o desenvolvimento de materiais para a recuperação de resíduos nucleares e estruturas metalorgânicas que poderiam transformar moléculas nocivas em benéficas para o meio ambiente.

Sou uma pesquisadora, faço o que for preciso para resolver um problema.

Suas habilidades em química computacional lhe permitiram trabalhar em diversos modelos e cálculos simultaneamente. Ela transitou sem problemas entre os diferentes campos à medida que aprendia como cada laboratório realizava experimentos.

Durante esse período, Laura Gagliardi, uma química quântica que hoje trabalha na Universidade de Chicago, começou a orientar Bernales. Gagliardi é originária da Itália, e Bernales relata que a orientação de uma mulher imigrante que havia montado um grupo de trabalho multicultural a ajudou a ganhar a confiança que ela não teve ao fazer pesquisa em seu país.

Sendo uma mulher em início de carreira em uma área dominada por homens no Chile, Bernales passou por situações que ameaçavam sua saúde mental e seu progresso profissional — alguns de seus colegas homens a assediavam e a invalidavam. Mas no laboratório de Gagliardi, Bernales prevaleceu.

“Ela realmente elevou essa pesquisa a um novo patamar”, diz Gagliardi. Bernales desenvolveu e aplicou métodos computacionais que combinavam simulações moleculares clássicas e abordagens de última geração para estudar materiais com comportamentos complexos de elétrons. Ela se tornou referência do Centro de Design de Catalisadores Inorganometálicos da UMN, um centro de pesquisa com foco em energia, afirma Gagliardi.

Varinia Bernales segura um suporte de frasco impresso em 3D e está usando um jaleco azul e luvas azuis. Conor Brew aparece em pé um pouco atrás, olhando para o suporte do frasco.
Credit: Sara Stathas
Varinia Bernales (frente) e Conor Brew, cientista pesquisador do UL Research Institutes, debatem como combinar simulações de materiais com dados experimentais de um difratômetro de raios X de pó.

Gagliardi lembra-se de Bernales como uma ponte entre os que criavam os modelos e os que realizavam os experimentos. “Ela era a segunda no comando da equipe”, conta Gagliardi.

Independentemente de estar no computador ou no laboratório, Bernales estava disposta a experimentar novos campos e resolver o enigma à sua frente. “Sou uma pesquisadora, faço o que for preciso para resolver um problema”, diz ela.

Hoje, Bernales assumiu um papel de liderança no UL Research Institutes, uma organização sem fins lucrativos voltada para a ciência da segurança, onde utiliza a química computacional para desenvolver novos materiais na remediação e proteção do meio ambiente. Seu cargo permite a ela aliar sua paixão por eliminar substâncias químicas tóxicas do meio ambiente à sua dedicação ao desenvolvimento de produtos mais seguros para a saúde humana e para o mundo.

Seus projetos nos UL Research Institutes incluem o desenvolvimento de materiais protetivos de última geração que evitarão que os bombeiros inalem produtos químicos tóxicos e a concepção de materiais para melhorar a segurança das baterias. Ela também está trabalhando com outros cientistas para desenvolver materiais que possam auxiliar na remoção de metais pesados da água ou de poluentes como o benzeno do ar.

A contribuição de Bernales para tornar o mundo melhor não se limita à sua pesquisa. Ela também é uma forte defensora das mulheres na ciência e tenta ajudar outras cientistas a terem acesso às mesmas oportunidades que ela teve. “Ela constrói relações de confiança muito rapidamente”, diz Peter Margl, cientista sênior de pesquisa da Dow, onde Bernales trabalhou antes de assumir o cargo nos Institutos de Pesquisa da UL. “Ela é incrivelmente dedicada aos direitos das mulheres e à igualdade de oportunidades para todos.”

Em 2018, Bernales começou a trabalhar como voluntária na competição de robótica FIRST (For Inspiration and Recognition of Science and Technology) com o objetivo de incentivar garotas a se interessarem por ciência. Ela declara que quer apoiar as mulheres com quem trabalha — e cientistas em geral — seja como colega ou orientadora, da mesma forma que Gagliardi fez por ela.

Ela também palestrou nas conferências Current Trends in Theoretical Chemistry (em português, Tendências Atuais em Química Teórica) no Peru e no Equador sobre química quântica e como esta pode contribuir para uma descrição mais precisa das moléculas. Ela espera organizar sua própria iniciativa para continuar levando conferências de química quântica para a América Latina e realizá-las em espanhol, de modo a diminuir a barreira do idioma em torno da química computacional. Segundo Margl, Bernales está em uma missão para consertar as coisas que não estão certas no mundo.

No decorrer de sua trajetória, Bernales continua em contato com suas raízes e com a família que a inspirou a contribuir para um mundo melhor. Sua tia Belgica ficou particularmente feliz quando soube que Bernales trabalharia com projetos de energia renovável no UL Research Institutes, conta Bernales. “Ela me disse que era maravilhoso que eu pudesse me dedicar a algo com tanto propósito”, diz Bernales.

A tia havia incentivado Bernales a ir atrás de seus sonhos e fazer um doutorado, a despeito do conselho de outros membros da família de se especializar em um campo supostamente mais pragmático, como a engenharia. No fim das contas, seguir sua verdadeira paixão valeu a pena.

Tradução para o português realizada por Luisa Forain para a C&EN. A versão original (em inglês) deste artigo foi publicada em 20 de setembro de 2024.

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